23 de abril de 2008

The Mechanic, aka Assassinato a Preço Fixo (1972), de Michael Winner

The Mechanic é um dos melhores filmes da parceria entre o diretor Michael Winner e o ator Charles Bronson. É também um dos menos conhecidos. Os dois fizeram um amontoado de filmes bacanas na década de 70 e 80, entre eles a série Desejo de Matar que Winner dirigiu até o terceiro capítulo e deu ao seu protagonista um certo status dentro de seu nicho. Charles Bronson foi sinônimo de cinema de ação de qualidade na época e merecia essa notoriedade, embora muita gente ainda o subestime como ator.

Inicialmente, haviam pensado em Cliff Robertson para papel de Arthur Bishop que, graças a Deus, ficou com Bronson. Robertson é ótimo ator e muitos outros também poderiam ter feito o personagem, mas para Bronson serviu como uma luva, pois é justamente no seu estilo de atuar (que seus detratores tanto detestam) que vem todo o charme que o personagem exigia para deixar marcas. Sua limitação em se expressar, transmitir sentimentos e até a forma como joga o cabelinho de lado são detalhes que ajudam a compor uma persona que nenhum outro ator conseguiria.

Arthur Bishop é um homem complexo. Ele tem tudo que quer e pode fazer o que quer. Mora numa bela mansão, possui bastante tempo para praticar esportes, beber um bom vinho, ouvir música clássica e planejar seu próximo assassinato. Ele é o melhor nessa profissão. Suas mortes são verdadeiras obras primas da frieza humana. Mas é um homem solitário, deprimido. Em determinada cena, ele paga uma prostituta (Jill Ireland, que foi casada com Bronson) para lhe escrever uma carta de amor, apenas pra se sentir apegado por alguém. Esse tipo de atitude demonstra todo estado de espírito de Bishop.

Outro detalhe interessante que demonstra a sua frieza é o encontro com Harry McKenna, um sujeito que foi amigo de seu pai e que trabalha na mesma organização que ele. Harry pede que Bishop tente convencer os superiores de livrar a sua cara, já que, por algum motivo, seu nome está sujo com a organização e Bishop tem uma certa moral com os criminosos porque seu pai era um dos conselheiros mais influentes da organização. No mesmo dia, Bishop recebe o pacote contendo as informações de seu próximo alvo, que é ninguém menos que Harry.

Da mesma forma como sempre fez, traça seu plano e mata com tranqüilidade sua vítima sem deixar qualquer resquício de amizade atravessar o caminho. Seu método de trabalho é dos mais surpreendentes. É pra entrar no grupo de melhores matadores profissionais da história do cinema. Nada de agir como “cowboy”, que significa matar a vítima rapidamente com um disparo ou algo nesse sentido. Seu método envolve paciência e análises calculadas que fazem de tudo para que os resultados pareçam mortes naturais. Como o ataque cardíaco que provocou em Harry.

Uma das únicas coisas na vida que ainda lhe dá prazer, e se orgulha muito disso, é seu trabalho. Por isso, nada impede que o realize, mesmo que precise continuar sendo o homem amargurado que é. Mas a situação muda no funeral de seu amigo, quando reencontra o filho do morto, Steve (Jean Michael Vincent, que é um péssimo ator!) e detecta alguma simpatia pelo rapaz, provavelmente sente um saudosismo em relação a sua própria juventude.

Já Steve enxerga uma figura madura em Bishop. Uma admiração muito forte. Algumas trocas de olhares fazem até parecer outra coisa e no mal sentido. Quando assisti com meu pai, ele soltava umas expressões do tipo, “Esse Charles Bronson ‘tá’ muito viado”. E eu tinha que explicar que não é bem assim. Que é mais uma admiração no sentido de preencher algum vazio de suas almas. Bishop exerga sua juventude no garoto enquanto Steve vê uma figura paterna que não teve enquanto seu pai estava vivo. Mas aí o meu velho achava mais ainda que eles fossem homossexuais. Mas tudo bem.

Antes de acabar o funeral, os dois saem e realizam uma jornada de descobertas. Bishop percebe o comportamento frio do rapaz em relação à morte do pai e de outras situações. Em uma seqüência, Steve assiste, sem mexer um dedo pra impedir, sua namorada cortar os pulsos. Logo, Bishop percebe que o rapaz serviria como um ótimo substituto. E Steve acaba descobrindo a profissão de Bishop e o interesse deste em colocá-lo no ramo. O rapaz aceita ingressar na profissão de mecânico, termo utilizado para definir os matadores de aluguel.

Aqui no Brasil o filme recebeu o nome de Assassinato a Preço Fixo, mas como comentou sabiamente o Felipe M. Guerra em sua crítica para o site Boca do Inferno, o preço dos assassinatos nunca é mencionado então como sabemos se é fixo? Por isso, prefiro chamar o filme de The Mechanic mesmo, que é o título original. De qualquer forma, Bishop coloca o rapaz em um programa de treinamento super rápido para se tornar um mecânico. O roteiro não trata com muita profundidade dessa relação de professor aluno. Ao invés, tenta criar de uma vez, rápidas seqüências de ação para quebrar o ritmo paradão que o filme possui, pois a verdadeira ação neste filme é psicológica.

Um alvo chega por encomenda e logo Steve vai poder fazer seu primeiro trabalho junto com seu mentor. Durante a ação, algo dá errado e Bishop precisa resolver a burrada do garoto. Melhor para o publico que vislumbra uma ótima seqüência de perseguição de motos. Entretanto, a organização criminosa fica furiosa pela bagunçada operação, e começa a questionar a competência de Bishop. Sendo assim, resolve mandá-lo para uma operação de urgência na Itália tendo que fazer no estilo Cowboy de matar que Bishop tanto detesta. Ao mesmo tempo em que desconfia deste trabalho urgente, ele descobre provas indicando que Steve já teria seu primeiro alvo, o próprio Bishop.

Michael Winner foi um dos bons (entre muitos) diretores de ação policial nos anos 70. Hoje não é muito lembrado, infelizmente. Talvez se não tivesse recusado Operação França ou a refilmagem de King Kong tudo seria diferente. Em The Mechanic, ele administra muito bem o ritmo, principalmente nas seqüências de ação, como a já citada perseguição de motocicleta e o grande final onde o tiro come solto nas paisagens italianas. Winner, geralmente era o editor de seus filmes, mas sempre com o pseudônimo Arnold Crust.

The Mechanic é lento para um filme de ação, mas muito bem pensado. E possui excesso de diálogos para um ator como Charles Bronson. Embora os geniais 16 minutos iniciais não tenham uma fala sequer. Apenas a elaboração perfeita de um assassinato realizado por Bishop, um dos melhores personagens desenvolvidos por Bronson. E ainda assim, quando o filme exagera nos diálogos, Bronson consegue demonstrar segurança em expressar as angustias do personagem tão bem quanto dizer suas falas.