2 de fevereiro de 2006

Munique e A Vida Secreta dos Dentistas

Antes das críticas, um adendo sobre as indicações ao famigerado Oscar: a primeira vista, sem surpresas (alguma novidade nisso?). O filme de Ang Lee conseguiu o maior número de indicações da noite do próximo dia 05 de março – oito –, sendo a de filme, direção, ator (Heath Leadger, quem diria), ator coadjuvante (para o ótimo Gyllenhaal), atriz coadjuvante, roteiro adaptado, fotografia e trilha sonora. Daí, Ronald levantou uma questão que, após ponderar, achei válida, e que, de certa forma, contradiz o que disse acima sobre a falta de surpresas: por que Capote e Bennet Miller? Por que não O Jardineiro Fiel e Fernando Meirelles? Ou então Marcas da Violência e David Cronenberg? Ah... Desculpe-me, eu me esqueci do juramento que fiz sobre não mais questionar os motivos obscuros por trás das indicações ao Oscar. No mais, não leve tão à sério. E se ficar enjoado, recorra àquele adoçante alucinógeno que você guarda no armário do banheiro - infalível.
felipe, editor cine art


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Munique

e 1/2

Munich, USA, 2005. DE Steven Spielberg. COM Eric Bana, Daniel Craig, Mathieu Kassovitz, Geoffrey Rush. 164 MIN. Universal. DRAMA

Munique, o novo filme de Steven Spielberg, é um ato de coragem e consciência. Assim como em 1993, quando fez A Lista de Schindler, Spielberg realiza uma obra mais séria e que chama a atenção pela forma que foi filmada. O filme retrata de perto um ataque terrorista que realmente ocorreu nas Olimpíadas de Munique onde um grupo de terroristas palestinos assassinou 11 atletas israelenses. Um tema que, com certeza, não seria do agrado de palestinos. Porém, acompanhamos as investigações de cinco agentes israelenses com uma missão secreta de assassinar todos os palestinos envolvidos no atentado. Mostrando passo a passo as investigações, Spielberg acaba revelando detalhes que também não agradariam aos israelenses. Enfim, Spielberg, apesar de ser judeu, acaba não tomando partido nem para o lado Israelense, muito menos para o lado Palestino. Ele fica no meio do muro. Mas não se prende muito a fatos históricos. Spielberg apenas se baseia no fato para realizar uma obra mais humana.

Assim como em A Lista de Schindler, Spielberg utiliza a violência como artifício para impressionar ou chocar o espectador. Munique é seu filme mais violento. Facada na cabeça, tiro na boca, corpos explodidos e metralhados. Tudo mostrando de forma explicita, muito bem produzido e realista. Sua avó vai adorar. A violência do filme soa mais como um bônus. Um detalhe a mais, pois o roteiro por si só, já deixa um gosto ruim na boca. O personagem interpretado por Eric Bana, Avi, não faz o tipo de herói estereotipado e não nos causa tanta identificação quanto ao seu trabalho, principalmente quanto a sua moral. E ao final do filme estamos esgotados, e não é por causa da longa duração, mas de presenciarmos todas as situações relatadas na tela.

Eric Bana, que é um ator mediano, está muito bem no papel que lhe coube e consegue criar as metamorfoses de personalidade necessárias que o personagem sofre devido as situações que passa. Ainda há a ótima presença do ganhador do Oscar Geoffrey Rush, num papel elegante. Todo elenco está afiado e tem a presença de Daniel Craig, o novo 007 e o diretor Mathieu Kassovitz.

Se em A Lista de Schindler, Spielberg havia atingido, em termos de direção, o grau de diretor maduro, aqui ele ganha o grau máximo de maturidade. Spielberg é arte. Tornou-se arte. É arte na hora que quiser. Espero que seja sempre, daqui pra frente. Mas eu sei que é só um sonho. Juntamente com o diretor de fotografia, Janusz Kaminski, Spielberg cria imagens com angulos interessantes e movimentos ousados, porém tudo tem um resultdo feio, azedo (principalmente nas cenas de ação) diferente do seu próprio cinema, e isso é um elogio.

Diferente também do seu convencional, é o desfecho da obra. Em todos os seus filmes, Spielberg dá um jeito de concluir com um final feliz, mesmo os seus filmes mais sérios como em A Lista de Schindler, no qual os judeus que Oscar Schindler conseguiu salvar são mostrados com grande otimismo, ou em O Império do Sol onde a criança consegue encontrar seus pais. Em Munique Spielberg nos entrega uma obra pessimista, realisticamente cruel. Temos a impressão que o mal não tem fim e nem lugar. A guerra não se concentra em um só ponto, mas se expande para todo mundo. Quando sobem os créditos, vemos Nova York, cidade onde Avi se refugia, e as torres gêmeas ainda intactas. Aguardando a sua hora...
Por Ronald Perrone


A Vida Secreta dos Dentistas

e 1/2

The Secret Lives of Dentists, EUA, 2002. DE Alan Rudolph. COM Campbell Scott, Hope Davis. 110 min. DRAMA.

O drama de Alan Rudolph – talentoso discípulo do mestre Robert Altman – apresenta uma abordagem singular e metafórica de uma crise conjugal protagonizada por dentistas (Scott e Davies, premiados pela crítica de Nova York junto com o roteiro). O casal trabalha no mesmo consultório e vive num lar aconchegante ao lado das três filhas pequenas. A crise irrompe quando ele começa a desconfiar da fidelidade da companheira e decide levar a situação em banho-maria, esperando ver no que vai dar. Age como um sujeito que sabe que seu dente está doendo, mas só toma mesmo a providência quando ele começa a doer. Um eficiente recurso narrativo, já utilizado por Wood Allen em Sonhos de Um Sedutor, transforma um paciente inconveniente (Leary) no alter ego invisível do protagonista. Quando ele surge do nada para palpitar nas situações mais agudas, a coisa fica mais divertida.
Por Felipe Mappa